segunda-feira, 17 de julho de 2017

Batalha na Polônia pela única floresta antiga da Europa

Foto: Krystian Maj/Agence France-Presse — Getty Images
No final do último mês de junho, cerca de 30 manifestantes reunidos de madrugada, em Postołowo, uma cidadezinha no Nordeste da Polônia.
Na borda de uma floresta, eles se acorrentaram a um imenso trator vermelho que arranca árvores com raiz e tudo. Máquina que corta até 200 árvores por dia, para fazer uma declaração contra o desmatamento em larga escala na última floresta primitiva na Europa.

O Parque Nacional de Białowieża, é área protegida e está localizado na voivodia da Podláquia (Podlaska), na fronteira com a Bielorrússia.
O parque tem 10.502 hectares, sendo que a parte mais antiguíssima é uma Reserva Integral (Rezerwat Ścisły) com 4.747 hectares e que encontra-se no centro da Floresta Primeva Bialowieża,

"Este é um solo sagrado, e há a necessidade de protegê-lo", disse Klaudia Wojciechowicz, artista de 41 anos de idade, que dirigiu seu carro a metade da noite para chegar a Postołowo.

A floresta de Bialowieża, Patrimônio Mundial da Organização das Nações Unidas, tem sido um campo de batalha há mais de um ano entre o governo conservador do país e dezenas de cientistas e defensores do meio ambiente. Autoridades polacas alegam que estão protegendo a floresta de uma infestação violenta de besouros, os empregos de moradores da região nas indústrias madeireiras.

"Eles querem destruir a floresta", disse Mariusz Agiejczyk e gerente distrital da floresta, observando os manifestantes de longe em meio à névoa do amanhecer. Ele disse que a infestação tinha destruído 4.047 hectares de floresta. "Se não fossem estes auto-intitulados ecologistas, nós poderíamos ter salvo aqueles hectares."

Mas os manifestantes, apoiados por ambientalistas, dizem que todas as operações invasivas na floresta primitiva põe em perigo seu ecossistema.
Estes ambientalistas são apoiados pela União Europeia, cujo braço executivo já avisou o goveno polaco que se ele não parar com o desmatamento, será processado pelo Tribunal de Justiça Europeu, acusado de violar as regras do bloco sobre a proteção ambiental.

A Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, ou Unesco, está do lado dos ambientalistas, também. Na semana passada, durante reunião do Patrimônio Mundial, em Cracóvia, os delegados aprovaram uma decisão em que pede ao governo polaco que interrompa a exploração de madeira na floresta, especialmente nas áreas de árvores de mais antigas. A Unesco também está considerando colocar a floresta na Lista do Patrimônio Mundial sob ameaça de extinção, geralmente listado em terras e territórios ameaçadas por conflitos armados e desastres naturais.

"É um laboratório biológico único, no qual podemos observar como aconteceram os processos naturais de 10.000 anos atrás", disse Tomasz Wesołowski, biólogo florestal da Universidade de Wrocław. "Mexer em qualquer coisa dentro da floresta é uma barbaridade."

O protesto organizado em Postołowo foi apenas um de uma série de atos de desobediência civil organizados, aqui, recentemente por ambientalistas para bloquear a exploração madeireira.

"Nós já tentamos de tudo - desde negociar com o ministério, até alertando as instituições internacionais", disse Katarzyna Jagiełło, funcionária do Greenpeace polaco. "Chegou a hora de tomarmos medidas desesperadas."

Foto: Kacper Pempel/Reuters
A floresta de Bialowieża está localizada nas terras baixas da Europa, fronteira entre a Polônia e Bielorrússia. Considerada uma relíquia entre as florestas antigas. Ela possui algumas das maiores e mais antigas árvores do continente europeu, bem como espécies raras e extintas em outros lugares. É também o lar da maior manada de bisões na Europa (existem outras duas apenas, uma na própria Polônia, em Niepołmice, perto de Cracóvia, e na Hungria que recebeu do governo polaco exemplares do bisão de Bielowieża).



A biodiversidade da floresta é imensa e é comparável a das florestas tropicais, disse Wesołowski, que tem visitado Bialowieża, nos últimos 43 anos, sempre na primavera.

Ainda assim, funcionários do governo dizem que Bialowieża não é uma floresta que se possa chamar de virgem, ou seja, um lugar onde são geradas espontaneamente variedades de espécies de árvores em tamanhos e classes etárias sem que tenha havido um mínimo de interferência humana.

"Não há uma única parte desta floresta que não tenha sido tocada por mão humana", diz Grzegorz Bielecki, um dos gerentes da floresta.

Isso não importa, rebatem os ambientalistas. "Dificilmente um lugar qualquer na Terra não tenha sinais de atividade humana", disse Jerzy Szwagrzyk da Universidade Agrícola de Cracóvia, um especialista em ecologia e silvicultura. "Mas de modo algum isso muda o significado desta floresta. Não há outro lugar como este no continente".

O ministro do meio-ambiente da Polônia, Jan Szyszko, um ávido caçador e antigo explorador florestal, disse recentemente no Parlamento de seu país que a UNESCO tinha "ilegalmente" listado a floresta de Bialowieża como Patrimônio Mundial, em 2014, e por isso mesmo, pediu que o Ministério Público investigue a designação do organismo mundial.

Szyszko se queixou em um painel apresentado por uma agência de notícias de ideologicamente de direita que a floresta de Bialowieża havia se tornado "uma espécie de carro-chefe para os movimentos de esquerda libertinos da Europa Ocidental."

Funcionários governamentais que administram as florestas que são propriedade do Estado, dizem que a infestação de besouros da casca do Abeto eclodiu em 2012, depois que o governo anterior de centro-direita reduziu significativamente o volume de madeira que podia ser explorado. Como resultado, dizem os funcionários do governo, que mais de 10 por cento dos Abetos foram atacados.

Foto: Wojtek Radwanski/Agence France-Presse — Getty Images
O atual governo triplicou os volumes de extração para as madeireiras em fevereiro de 2016, e revogou a proteção existente para árvores são mais de um século de idade. Desde 2012, as madeireiras derrubaram quase 180.000 árvores que segundo elas estariam infectadas. Das árvores derrubadas este ano, 25% tinham pelo menos 100 anos de idade.

Szwagrzyk, da Universidade Agrícola disse que, desde quando o corte foi permitido para certas áreas na floresta - excluindo as reservas naturais e o parque nacional - a pequena infestação continuou a se espalhar para áreas que fora dos limites de Bielowieża, mesmo com as árvores infectadas terem sido removidas.

O complicado estatuto jurídico da floresta contribuiu para as dificuldades encontradas para proteger a floresta primeva. A Polônia e a Bielorrússia tem administrado suas porções separadamente por décadas.

A parte polaca tem mais de 20 reservas naturais, um parque nacional e uma floresta comercial. As divisas de algumas das reservas não são claras, levando a disputas sobre nestas áreas permitidas às empresas madeireiras.

A melhor solução, e nisso os especialistas concordam, seria transformar toda a floresta em um parque nacional, mas o atual governo conservador da Polônia  tem torpedeado todos os esforços nesse sentido.

O destino de árvores mortas pelo besouro é outro ponto em disputa. Os madeireiros defendem que madeira infectada deve ser cortada por razões de segurança. Mas os ambientalistas afirmam que a madeira em decomposição é  ingrediente indispensável em uma floresta primitiva. Cerca de 40 por cento de todos os organismos que vivem nela, incluindo insetos, fungos e aves, estão criticamente dependente dos abetos mortos ou a prestes a morrer.

Os ecologistas dizem que a direção das Florestas Estatais está cortando as árvores mortas porque precisa do dinheiro proveniente da exploração comercial. A instituição é obrigada a ser financeiramente auto-suficiente, e quase 90% de sua receita - 7 bilhões złoty (cerca de US$ 2 bilhões de dólares) em 2015 - veio da venda desta madeira.

O escritório do distrito florestal disse que não mantêm registros das árvores mortas removidas, mas Bielecki, um dos gerentes distritais, chamou as acusações de "profundamente injustas".

Enquanto o destino da floresta está sendo considerado o biólogo Wesołowski, advertiu que algumas coisas não podem ser desfeitas. "Não podemos restaurar a floresta primitiva", disse ele.

"Se pudéssemos, teríamos feito isso já em algum lugar perto de Berlim ou Londres. Nossa floresta de Bialowieża é o único lugar, onde alguns idiotas, estão tentando destruir".

Fonte: The New York Times
Texto: Joanna Berendt
Tradução: Ulisses Iarochinski

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